19.8.09

Furtivo

Eis meu processo de ir além: Usei a blusa dele emprestada - esse frio traiçoeiro que sempre chega quando a pressa bruta desperta a desatenção. Foi mera casualidade: era ele que, naquele momento, tinha o calor que eu precisava - muito. Ainda que isso quase já tenha se tornado comum. Afinal, a pressa, a desatenção, o frio e a caualidade não são fenômenos nada raros.
(...)
Usei a blusa para dormir. Não costumo fazer devoluções instantâneas. Além do mais, ela era tão macia. Jurei à minha consciência que o perfume - que há tantos dias não sentia - nada tinha a ver com a minha escolha. A consciência fica tão no fundo do fundo de nós, que nunca consegue ver se os dedos dos nossos pés estão cruzados.
Usei a blusa. Apenas. E jurei mais uma vez, acreditando na mopia da nebulosa consciência - aquela, do fundo no fundo - que isso nada tinha a ver com a sauade. Eu não quero sentir o cheiro dele a embriagar meus sonhos, tendo a ilusóra sensação de que ele está em mim - mais forte do que abraço forte em dia de trovão. Não preciso acreditar que ele me dá as mãos e as asas enquanto eu navego pelo macio do nosso castelo.
(...)
Ainda não devolvi a blusa. Os dias andam corridos. Dobrada - da forma como ele me ensinou. É segredo! - ela está debaixo do meu travesseiro. Ainda que não me permita tê-lo em mim - mais forte do que trovão - deixo que ele cuide dos meus sonhos, a segurar com a malícia dos anjos maus intencionados, a casa dos meus devaneios.